domingo, 13 de novembro de 2016

Sobre a infância e seu tempo

Sobre a infância e seu tempo

Ah, a infância… como é bom admirá-la! Não há pressa. Não há tempo. Só o seu tempo interessa. Tempo de caminhar devagar, de observar, de tocar, de sentir. Tempo de sonhar.
Por que é tão bom observar as crianças em suas pesquisas, em suas descobertas, em suas indagações? As palavras de Alfredo Hoyuelos descrevem muito bem esse sentimento quando dizem que a infância nos comove por nos provocar a nostalgia de emoções aparentemente esquecidas. Segundo ele, as crianças nos fascinam por sua capacidade de transformar momentos cotidianos (e, muitas vezes, repetidos) em únicos, intensos e preciosos. E, para isso, precisam de tempo. De seu próprio tempo.
A pediatra Húngara Emmi Pikler escreveu um livro cujo título parece um grito reivindicativo da voz da infância _ “Deem-me tempo” _ num pedido para que não se antecipem os ritmos de desenvolvimento das crianças pequenas, aguardando, assim, o tempo de aprendizagem de cada uma. E é nesse esperar que, segundo Hoyuelos, surge o inédito, o surpreendente, e que devemos, como educadores, aproveitar esses momentos em sua plenitude, acolhendo-os e os registrando.
Portanto, devemos repensar o tempo que nossas crianças passam no ambiente escolar. Muitas vezes, 5,6, 10, 12 horas… o que propomos para elas nesse período? Que descobertas e aprendizagens estamos proporcionando? Faz-se muito necessário repensar o conceito de tempo das propostas escolares e, sobretudo, da organização da jornada escolar das crianças. Repensar o porquê de interromper bruscamente o que as crianças estão fazendo, interromper seu pensar, suas construções, suas brincadeiras, não deixando que as crianças deem o máximo de si, como disse Malaguzzi.
Sejamos como as crianças, que ainda têm olhos encantados. Vejamos cada momento, mesmo que familiar, como inédito em nosso cotidiano como educadores. Educadores de sentimentos, de desejos, de sonhos. Educadores do presente, não do futuro.
Anáile Abrahão
imagem4 Poema de Anáile Abrahão
Referência:
HOYUELOS, Alfredo. Los tiempos de la infancia. Disponível em:< http://ice2.uab.cat/jor_infantil_VIII/materials/conf2.pdf>.

Reggio Emília e a valorização da primeira infância

Reggio Emilia e a valorização da primeira infância

A primeira vez que ouvi falar sobre Reggio Emilia (uma cidade de 168 mil habitantes localizada no norte da Itália) foi em 2008, em um grupo de estudos formado por educadores que se debruçava sobre a leitura do livro “As cem linguagens da criança”, que apresenta o projeto educacional desenvolvido naquela comunidade. O objetivo da abordagem educacional lá desenvolvida é, segundo seus educadores, criar uma criança protagonista, investigadora, capaz de descobrir os significados das novas relações e de perceber os poderes de seus pensamentos por meio da síntese de todas as linguagens: expressivas, comunicativas e cognitivas.
Conhecer a prática de valorização da infância tão presente em Reggio só fez aguçar ainda mais meu interesse pelo assunto. Minhas leituras sobre o tema continuaram e, com elas, veio o desejo de conhecer de perto esse trabalho tão fascinante.
Esse sonho ficou adormecido por alguns anos até que, em maio de 2012, juntei-me a um grupo 250 apaixonados pela Educação e voamos até a Itália na busca de troca de experiências pedagógicas e de conhecer um pouco mais sobre a abordagem utilizada nas escolas Reggianas.
reggio
Foi uma semana mágica e cheia de descobertas! Os estudos aconteceram no Centro Internacional Loris Malaguzzi, cujo nome foi dado em homenagem ao idealizador da proposta educacional seguida pelas escolas da comunidade. Foram muitas palestras e apresentações de projetos, mas o que mais nos tocou e nos deixou boquiabertas foram as visitas às escolas. Nelas, pudemos conhecer professoras e coordenadoras locais e perceber que todo o ambiente escolar é permeado pelas criações das crianças; ambiente no qual imperam a preocupação estética e a organização; ambientes cheios de luz, cores, sons e perfumes.
loris???????????????????????????????
Impossível não se comover. Impossível não se inspirar. Foram muitas descobertas que possibilitaram meu crescimento e aprimoramento profissional e o desejo de aprender cada vez mais sobre como transformar nossa realidade inspirada em uma prática educativa tão bem sucedida.
 Anáile Abrahão
Ao longo desse mês, postaremos uma série de textos e dicas sobre a Abordagem Reggio Emilia para a Educação Infantil. Aguardem!
Quer saber mais?

“As cem linguagens da criança” Carolyn Edwards, Lella Gandini e George Forman _ Editora Artmed



procura

“`A procura da dimensão perdida” _ Giordana Rabitti _ Editora Artmed

A Abordagem de Reggio Emília

A Abordagem Reggio Emilia para a Educação Infantil (parte2): um breve histórico

 “… cem mundos para descobrir
…cem mundos para inventar
…cem mundos para sonhar…”
Loris Malaguzzi, idealizador da abordagem Reggio Emilia
          As escolas de Reggio Emilia, em meu modo de ver, representam um marco na organização da sociedade civil dessa região italiana, pois foram os próprios pais dos alunos que, em meio aos escombros da Segunda Guerra, aproveitaram os tijolos e os ferros das casas bombardeadas para construir escolas para as suas crianças, dando-nos o testemunho de que é possível transformar a realidade quando há ideal, determinação e compromisso.
As escolas foram organizadas, inicialmente, em locais improvisados (e não construídos para o desenvolvimento de atividades com crianças pequenas) com participação ativa dos pais, que entendiam que eles deveriam, também, participar da educação formal (e, portanto, escolar) de seus filhos.
O esforço e o desejo desses pais recebeu direcionamento através da extraordinária visão de Loris Malaguzzi, um jovem professor naquela época, que dedicou a vida ao desenvolvimento de sua filosofia conhecida como Abordagem Reggio Emilia para a Educação Infantil.
O sistema educacional do município de Reggio para crianças pequenas (de três meses a seis anos) sempre se caracterizou por ser uma comunidade de pesquisa e de intenso trabalho de formação de professores. Sua estrutura tem uma forte organização, um grande relacionamento com a comunidade e uma intensa participação dos pais.
As escolas de Reggio Emilia se tornaram visíveis aos olhos de todo o mundo quando, em 1991, a revista americana Newsweek escreveu um longo artigo destacando-as como uma das melhores do mundo em Educação Infantil.
Mas, afinal, o que é a Abordagem Reggio Emilia?
         No ponto central da Abordagem Reggio Emilia para a Educação Infantil está a crença de que as crianças são cheias de  curiosidade e criatividade. Em suas mentes, não existem espaços vazios esperando serem preenchidos por fatos, imagens ou datas. Por isso, o currículo nas escolas é flexível e emerge das ideias, pensamentos e observações das crianças. Seu objetivo principal é cultivar uma paixão permanente pela aprendizagem e pela exploração.
Os seguintes fatores são inerentes a essa abordagem:
  • A imagem da criança como protagonista, investigadora e comunicadora;
  • O professor como parceiro, guia, pesquisador e  aprendiz;
  • A importância da Arte como linguagem expressiva;
  •  A cooperação como base de todo o sistema educacional;
  • O ambiente como o terceiro professor;
  • Os pais como parceiros no processo de ensino- aprendizagem;
  • A Documentação Pedagógica como forma de comunicação.
Nas próximas semanas, cada um desses aspectos será apresentado separadamente, apesar de serem totalmente correlacionados.
Anáile Abrahão
Quer saber mais?
 download
“Diálogos com Reggio Emilia: Escutar, Investigar e Aprender”, Carla Rinaldi, Ed. Paz e Terra, 2012.

Referências Bibliográficas:
THE REGGIO EMILIA APPROACH TO EARLY YEARS EDUCATION. Glasgow: Learning and Teaching Scotland, 2006. 50p.
MIRANDA, Heide. O imaginário nas escolas de Reggio Emilia, Itália. 2005. 7p.

O IMAGINÁRIO NAS ESCOLAS DE REGGIO EMÍLIA 2

O imaginário nas escolas de Reggio Emilia

A proposta pedagógica das escolas da infância de Reggio consiste em criar, constantemente, uma rede de comunicação e paz. Os diálogos desenvolvidos entre criança-criança, criança-professor e entre o grupo de professores são essenciais e diferem enormemente das escolas onde todos falam e ninguém ouve. Em Reggio, os professores entendem que as crianças falam para dizer algo, para se comunicar _ necessidade básica de qualquer ser humano_ e desenvolvem o que chamam de Pedagogia da Escuta, ou seja, as falas das crianças são registradas e se tornam parte da documentação dos projetos, relatórios e diários. Como a preocupação fundamental é a unidade entre educação e cultura, as crianças e a escola têm contato estreito com toda sua forma de representação: teatro, cinema, shows, concertos, exposições. As atividades culturais da cidade e do país são veiculadas em forma de cartazes que, harmoniosamente, são afixados nos murais das escolas. As escolas, por sua vez, estão representadas na sociedade pelos desenhos das crianças, que ilustram folders de hotéis, panfletos de lojas, a lista telefônica, existindo, ainda, a possibilidade de decorar lojas da cidade com “obras infantis”, num intenso movimento de diálogo e participação escola-sociedade.
Mapa da cidade feito com desenho das crianças
Mapa da cidade feito com desenho das crianças
A criança como protagonista de sua aprendizagem Diferente de muitos trabalhos dos quais temos conhecimento, as crianças, nas escolas de Reggio, se comportam como protagonistas nos projetos desenvolvidos; elas não são “atores” nos trabalhos desenvolvidos mas, sim, autores. A criança, em Reggio, é vista como competente, forte e rica – uma criança produtora e não apenas usuária de cultura. Essa postura ratifica a ideia de educação da infância e não educação pela infância, porque não é o adulto que faz para a criança. Ele é o mediador dos seus desejos e de suas necessidades. Nesse processo, a ambientação e o espaço físico são planejados para facilitar o diálogo e a comunicação entre os vários ambientes escolares. As plantas das escolas não têm um projeto único, mas valorizam um espaço central chamado de piazza, onde todos da escola podem se encontrar, e a cozinha como um local que simboliza a cultura italiana. Evitam a planta horizontal e eliminam os corredores por darem a impressão de hierarquização. Valorizam a planta que permita, com um único olhar, que toda a escola seja visualizada por todos.
fonte: mamaesabetudo.blogspot.com
fonte: mamaesabetudo.blogspot.com
fonte:www.feelgood-desgins.com
fonte:www.feelgood-designs.com
Como a imaginação se destaca nesse universo educativo No trabalho dos professores de Reggio destaca-se, dentre outras coisas, o poder da observação como uma postura de valorização dada à criança, de validar sua curiosidade e de estimular nela o desejo de conhecer o mundo que a rodeia. Entende-se que a mais importante capacidade humana é a de imaginar, e isso, na proposta desenvolvida em Reggio, existe em abundância. Lá, o elemento criativo é imenso, a começar pelas salas de aula, que foram substituídas por grandes ateliês (ou acoplados a elas mini-ateliês), ricos em objetos diversificados, que aguçam o processo criativo e aumentam as experiências das crianças.  Nos ateliês, elas podem manipular e trabalhar com botões, tecidos, velas, retalhos de papéis, diferentes tipos de grãos, sementes, pedaços de madeira, lã, além de objetos comuns em ateliês: mesas de espelho, mesas de luz, pincéis, diferentes tintas, cavaletes, tesouras, réguas, entre muitos outros. Esses recursos são livremente utilizados pelas criança e icluem, também, objetos apontados por nós como perigosos: vidros, arames encapados, tesouras com pontas..
O papel do adulto, tanto o professor como o atelierista, no processo de construção e levantamento de hipóteses do pensar sobre algo é criar possibilidades de concretizar as fantasias infantis. Em um dos projetos, o “Parque de Pássaros”, as crianças imaginaram como seria fantástico se os pássaros também tivessem um parque de diversões, uma fonte para se refrescar e outros brinquedos para os alegrar. A função do adulto, nesse caso, foi a de alimentar essa ideia e construir uma rede de parcerias com a comunidade: imprensa, os profissionais da área da construção _ o encanador, por exemplo _ e professores que utilizavam os desenhos e as ideias dos alunos e discutiam o processo de descoberta e desenvolvimento das crianças. Esses professores encorajam seus alunos a realizar experiências que, a princípio, parecem inviáveis para a escola. Em Reggio, os professores se utilizam dessas fantasias, encorajando as crianças a discutirem as possibilidades de realização de novos experimentos. Com isso, o professor aproveita as explicações e falas dos alunos como objeto de estudo do potencial infantil, para cultivar e promover o processo criativo, apontar a importância do respeito às ideias do outro e entender que as crianças criam verdadeiras teorias a partir de suas observações. Dessa forma, a liberdade de poder manifestar suas ideias as leva a se expressarem de maneira extremamente poética.
Anáile Abrahão
Quer saber mais?
images“O papel do ateliê na educação infantil” – Editora Artmed
Referência bibliográfica: Miranda, Heide. O imaginário nas escolas de Reggio Emilia. In: I Seminário Educação, Imaginação e Linguagens Artístico-Culturais. 7p.

sábado, 12 de novembro de 2016

Acreditando na INFÂNCIA

É preciso subir o nível das leituras!
Esse foi meu presente de Natal (achei uma doida como eu) dado por minha amiga e parceira de sonhos, Danielle.



As Camadas atmosféricas em feltro

Sentia a necessidade de fazer um painel desse para os pequenos!!!
Eu achei lindo.




Coloquei um satélite e um telescópio espacial





Mesmo sabendo que nessa camada ainda há gravidade coloquei o astronauta sendo "puxado" pelo foguete!









Todos os objetos do painel são em feltro e interativos!

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Saia Contadora de Histórias

Essa saia eu vi no Facebook. Uma amiga me marcou na postagem que tinha uma moça, que hoje eu sem que é, uma contadora de histórias do sul - Adriane Zenni. Na hora em que vi essa saia me apaixonei de cara!!!
Fiz uma pra mim!!!












TOCA da Lagarta na Maçonaria

'Tecida na interação da Criança consigo mesma, com a outra e com o mundo, a Cultura Infantil é única, vária e una em cada gesto. E a Criança, infante que é de sua espécie, necessita, como todas as outras, de seu espaço natural – a Natureza, pois, para inaugurar seus talentos e desenvolver seu movimento próprio com viço e alegria.'
Lydia Hortélio




















“O Homem só é inteiro quando brinca, e é somente quando brinca que ele existe na completa acepção da palavra Homem”.
Schiller 

Simpósio de Educação Infantil na UESSBA






terça-feira, 23 de agosto de 2016

Entrevista com Lydia Hortélio

A Casa das 5 pedrinhasLydia Hortélio

"Brincar é o último reduto de espontaneidade que a humanidade tem"

Faz mais de 30 anos. Lydia Hortélio não poderia estar mais distante do mundo de canções infantis e brinquedos que a transformou na pensadora da arte de brincar que é hoje. Estava na Universidade de Berna, na Suíça, cursando piano clássico. Naquele dia, tinha dificuldades para tocar um trecho de uma sonata de Beethoven. Suas tentativas frustravam o professor, o húngaro Sandor Végh. Para ajudá-la, ele pediu que imaginasse um rei dançando com a rainha em uma festa da corte e assimilasse, da memória de seus movimentos, o segredo para tocar o minueto. E, então, ele partiu para o meio da sala e dançou como um rei. Lydia olhou para o professor e entendeu tudo, mas não conseguiu executar. Aquela música não estava no seu corpo. Impaciente, o professor voltou-se para ela e disse-lhe: "Que pena que vocês (brasileiros) não tiveram um rei!". Instantaneamente, seu pensamento cantou: "E daí? E daí?".
Foi o estalo. A partir daquele momento, Lydia Hortéliocomeçou a procurar a sua música. Não quis mais estudar piano e voltou para o Brasil, mais precisamente para Serrinha, na Bahia. A partir daí, começou a gravar tudo o que ouvia de música popular, mas não sabia ainda como usar o material. De volta à Europa, decidiu estudar etnomusicologia e tomou contato com um trabalho dos compositores Bartók e Kodály, um vasto lenvantamento da música da cultura infantil da Hungria. Percebeu que havia um paralelo com o Brasil e, desde então, vem documentando e coletando tudo o que encontra sobre a música tradicional da infância e os brinquedos, representações do que ela chama de o "Brasil encoberto".



Pátio - Quando o seu trabalho com a música se mistura com o trabalho da educação infantil?

Lydia Hortélio - Quando comecei a estudar etnomusicologia, mostrei a meu professor, o húngaro Sandor Veress, várias cantigas da minha infância. Ele disse: "Pois é, só que a melodia é só uma dimensão de um fenômeno muito mais complexo, muito mais rico, que é o brinquedo ele mesmo". Até ali eu havia tido uma educação pinçando a melodia das músicas. Então, percebi algo que mudou a minha vida: a música tinha poder de mover uma ação. Em uma música como "olha o camaleão/olha o rabo dele/segura esse nêgo...", por exemplo, as crianças formam uma fila e uma pessoa é a cabeça do camaleão. Ela canta isso e cumpre um roteiro entrando e saindo daquela fila, e aos poucos vai se formando o camaleão. Isso tudo é o brinquedo camaleão. A melodia, tão bonitinha no começo, agora desaparece, porque a ação dramática é muito mais forte. E há uma infinidade de ações dramáticas com uma linguagem de movimento própria em cada brinquedo. O brinquedo é a palavra, o texto literário; é a música, o movimento; é o drama e o outro, o companheiro de brinquedo. E isso é um todo indivisível.

Pátio - E o que essas músicas ou brinquedos representam na nossa cultura, na nossa educação?

LH - Aquelas músicas que a gente cantava na adolescência, por exemplo, quando a menina descobre o menino, o menino descobre a menina, e a gente tira versinhos de amor nas rodas, são, pode-se dizer, as últimas formas de música da cultura infantil. São verdadeiros ritos de passagem para chegar à idade adulta. Fizemos um disco recentemente - o Abra a Roda Tindolelê - em que tento fazer um arco, uma curva de toda a música tradicional da infância com as várias estações que ela tem, começando das rodas de verso da adolescência e crescendo, como gosto de dizer, cada vez mais pequenino, até chegar às canções de ninar. Algumas músicas são nitidamente herança indígena, outras ibéricas, outras da cultura negra. São os arquétipos da nossa cultura.

Pátio - Existe uma definição do que é brincar? Quando é que eu sei que estou brincando como uma criança ou como um adulto, se é que é possível brincar como adulto?

LH - Acho que não.

Pátio - Então, quando adultos, só podemos aprender a brincar com as crianças...

LH - É a nossa chance ter uma criança perto para ver como é, entrar no movimento outra vez, no mundo dela. Para aprender a brincar, é preciso, em primeiro lugar, não querer brincar. Não pense em querer nada. Você está à toa na vida e, de repente, um gesto lhe chama e você se esquece de você, você entra no brinquedo. É um mistério. Eu não saberia, a esta altura, dizer o que é brincar. Mas é tudo o que mais busco, a inspiração da minha vida. Quando você brinca, você se esquece de si mesmo e faz parte do todo. Na hora, você não tem consciência disso, você é feliz, vive uma inteireza. Brincar é, para mim, o último reduto de espontaneidade que a humanidade tem. É a língua do ser humano. Vamos perdendo essa língua à medida que entramos na escola - e hoje com a televisão. Você está vendo a Xuxa outra vez se aproveitando das crianças e achando que está brincando e levando a brincar. Então, cuidado com isso. No sertão, que é tão seco, quando as pessoas encontram um olho d'água, elas o cercam com todo o cuidado para o animal não pisotear. Acho que é esse olho d'água que está esperando a gente cuidar dele e beber aquela água dali.

Pátio - E qual o papel do educador nesse processo de recuperação, de valorização da música e do brincar?

LH - Durante um projeto que desenvolvi na Bahia, em 1980, fotografava meninos brincando, meninos do povo, porque nossos filhos estão confinados e não brincam uns com os outros livremente. Porque um menino precisa de outro menino, não precisa de professor, não. Chega um momento em que a gente vai introduzi-lo nas conquistas da humanidade, é para fazer isso também. Mas para o crescimento dele na sua unicidade como ser humano é mais importante brincar, pois é aí que ele aprende liberdade. Um grande homem alemão, que se chama Friedrich Shiller, diz o seguinte: "O homem só é inteiro quando brinca, e é somente quando brinca que ele existe na completa acepção da palavra Homem".

Pátio - Em muitas escolas, talvez na maioria delas, existe a hora de estudar e a hora de brincar. Seria necessário mudar o modelo de escola para que não houvesse essa distinção, ou cabe ao professor fazer isso?

LH - Antes de mais nada, esta é uma questão da consciência. É a professora, em primeiro lugar, que deve trabalhar a si mesma, chegar a esse ponto, à consciência de uma compreensão da criança através da cultura da criança. Todo mundo só lê a psicologia do desenvolvimento, o construtivismo, que tem sua procedência também, mas não é a resposta total do ser humano.

Pátio - Então, o professor também precisa passar a aprender com a criança?

LH - Pois é. Precisa olhar o menino para entrar em um percurso que seja natural, que seja dos dois lados um aprendizado. E isso cada um irá fazer de acordo com a consciência que tem, com a experiência de vida que tem. Acho que se deve estabelecer uma alfabetização ao contrário. Nós temos de nos alfabetizar na cultura da criança. É isso que ainda não está acontecendo, com poucas exceções. A gente vê menino e quer ensinar. Primeiramente, você precisa viver - conviver - com ele e, nesse diálogo, nesse "estar com ele", as coisas vão acontecendo. Agora, para que isso aconteça, é preciso que esse professor tenha andado muito na sua própria consciência, precisa estar em uma busca de si mesmo. A gente não pode receitar.

Pátio - Que autores influenciaram a senhora?

LH - Eu não li em lugar nenhum, devo dizer isso muito humildemente. Tenho agido de acordo com as minhas descobertas. Encontro inspiração em autores como Schiller, nas Cartas Estéticas. É um pensamento ou outro. E em Walter Benjamin, que diz: "Verdadeiramente revolucionário é o sinal secreto do vindouro, o qual fala pelo gesto infantil". Foram frases como essas que bateram como um raio, despertando ou confirmando em mim um sentimento que eu tinha e não via em lugar nenhum. Leio e, de repente, já estou pensando em outras coisas.

Pátio - Além da construção subjetiva da criança, qual o papel da vivência das brincadeiras na construção de um espírito de brasilidade?

LH - Acho que a música tradicional da infância é o que de mais sensível e mais essencial existe na cultura de um povo. É o nascedouro da cultura brasileira. Nessas músicas do disco, como disse, podemos perceber heranças das culturas africana, ibérica e indígena. Você percebe um substrato e reconhece que aquilo é Brasil. Gosto de dizer: "Qual é o verso que queremos cantar na roda das crianças do mundo?". O Brasil é para ser cantado e dançado. Se não cantar e dançar, não se sabe o Brasil. Um amigo me disse que aprendeu as músicas do disco que fizemos com o filho de um ano e meio, que mal balbucia. Esse menino está adquirindo a língua-mãe musical, porque está cantando nos vários estilos, gêneros, sem saber as leis internas da música do Brasil, com todas as vertentes dessa música. Então, esse menino é um menino brasileiro. Para mim, esta é a maneira mais feliz de construirmos a identidade cultural.

Pátio - Conte um pouco da sua atuação como coletora de músicas, brinquedos, brincos...

LH - Recolhi nesses anos todos representações do fenômeno brinquedo na pintura, na literatura, em achados arqueológicos, coletei músicas tradicionais da infância e objetos-brinquedos. Existem objetos-brinquedos inventados por crianças, criados pelos fazedores de brinquedo, como o clássico Mané Gostoso, um marionetezinho com duas varas que você aperta e faz malabarismos - o Brasil inteiro conhece. Esses brinquedos da cultura popular brasileira têm um princípio de funcionamento que é sempre um exemplo de física. Por ali você entra em ciência também.

Pátio - Quer dizer que esses brinquedos poderiam estar na escola como apoio às aulas de física, matemática...

LH - Claro. Não sei o que a escola está fazendo que não se inspira na cultura popular, em que tudo é elementar. Fácil de compreender e, a partir daí, desenvolver. Se estudarmos a cultura popular compreendendo que ali o Brasil está encoberto, puxaremos o fio do novelo que está ali. A educação do Brasil deveria caminhar por aí, não como um regionalismo, mas como algo muito mais profundo e digno de conhecimento. As crianças procedem por uma construção de conhecimento que não é pelo raciocínio lógico, não é a compartimentalização. Com elas é uma consciência de inteireza, em que o sentir, o pensar e o querer fazem parte de uma unidade.

Pátio - Como a senhora tem trabalhado a classificação das brincadeiras da cultura infantil?

LH - Tenho tentado fazer isso, mas às vezes me afasto porque fico com a impressão de que eu quero meter a vida no bolso, quero saber, é uma coisa do poder, que é da nossa cultura ocidental, de que no momento em que você bota no bolso, dá nome, você sabe. E o que vejo é que os tipos e subtipos de brincadeiras, os seus cruzamentos são tão infinitos que me dão um baile. Faço para ver o que tem e como se mistura com algo que esteja ali ao lado, mas não para classificar. Por exemplo, no caso da música tradicional da infância: existem os brinquedos da adolescência, que têm determinadas características. Depois os brinquedos cantados, nos quais a melodia é mais forte. Depois os brinquedos mais ritmados, em que o ritmo e o corpo têm uma expressão maior. Depois as parlendas, mais para as nuances da fala, as cantilenas, que caminham mais para as nuances da voz, mas ainda não são cantigas, depois as cantigas. Procuro também colocar em blocos os brincos, que são os brinquedos dos meninos pequenos, que precisam da ajuda de um adulto. Isso serve para compreender os momentos e o desenvolvimento da criança.

Pátio - A senhora poderia explicar o que quer dizer quando denomina seu trabalho como de documentação e recriação?

LH - A documentação é quando eu fotografo, gravo aquilo que vejo, o movimento da criança, os momentos da cultura da criança. Já esse disco é um projeto de recriação. Levei muito tempo para fazer porque achava que era impossível trazer para ele todas essas dimensões da cultura da criança, já que entra só a música. Peguei um grupo de meninos que canta muito naturalmente, não tem aquela afinação exacerbada dos coros de crianças, para guardar a dimensão da espontaneidade e do inacabado, que é a criança. E nós, junto com os arranjadores, descobrimos todas as dimensões das várias vertentes da cultura brasileira que incidem na cultura da infância e as recriamos.

Pátio - A senhora está desenvolvendo um projeto voltado para a cultura infantil em São Paulo. Poderia falar um pouco sobre ele?

LH - A Monumenta, do Ministério da Cultura, tem um terreno atrás da Pinacoteca, no bairro da Luz. Fui convidada para criar ali um espaço para a criança, com a cultura da criança, um museu de brinquedos. Vamos recuperar a natureza ali presente e chamaremos o lugar de Quintal da Luz.

Pátio - É na linha da Casa das Cinco Pedrinhas?

LH - A Casa das Cinco Pedrinhas ainda não existe fisicamente. É um sonho, inspirado em um poema de Fernando Pessoa, no qual ele, menino, poeta, está brincando - e não jogando, como se diz - as cinco pedrinhas com o menino Jesus, Deus e divino: "Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas/no degrau da porta de casa,/ graves como convém a um Deus e um poeta,/ como se cada pedra fosse todo o universo/ e fosse por isso um grande perigo para ela/ deixá-la cair no chão". Então, é preciso jogar as cinco pedrinhas para saber o que ele está dizendo. Para entender a compreensão que ele tem da criança, do divino e do ser humano. Eu entendo naquele poema que o ser humano é criança e é divino. E nisso eu encontro tudo o que busco.

Pátio - O que seria essa casa?

LH - Um lugar de brinquedo. Onde as crianças pudessem brincar, construir. Em vários momentos surgiram instituições que quiseram fazer esse projeto, mas não deu certo. Depois pensei que não deveria fazer casa nenhuma, que as cinco pedrinhas deveriam existir no coração de cada um que se identificasse com esse sonho, e tomei distância. Não quero que se transforme em um lugar de educação. Ela existe no coração de muita gente que se aproximou de mim e já faz esse sonho à sua maneira, e o que me gratifica profundamente é que cada um faz de uma maneira diferente. Um amigo chega a incluir em seu currículo "membro da Casa das Cinco Pedrinhas" (risos). A Casa das Cinco Pedrinhas pode ser criada em vários lugares. 

História OBAX

Uma história apaixonante. De um pernambucano hiper sensível - André Neves.
Que o mundo esteja cheio de OBAX trazendo suas chuvas de flores!!!


Gostei da minha caixa.
Fui inspirada num trabalho de uma artesã daqui de minha cidade - Rose.


Amei minha Nafisa


Todos dentro da caixa. KKKKKKKKK
Um aperto bom!!!


Essa Chuva de flores me encanta!!!
São de crochê.


Minha nuvem esconde um segredo!!!



Obax












sábado, 30 de julho de 2016

Uma criança saudável é espontânea, barulhenta, inquieta, emotiva e colorida!

Uma criança saudável é espontânea, barulhenta, inquieta, emotiva e colorida!: Uma criança não nasce para ficar quieta, para não tocar nas coisas, ser paciente ou entreter-se. Uma criança não nasce para ficar sentada a ver TV ou a jogar no tablet. Uma criança não quer ficar quieta o tempo todo.

segunda-feira, 4 de julho de 2016

MAIS CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS

Mais uma contação!!! Agora com o Caixote do Nestorzinho!!! Essa foi para a primeira Reunião com os pais da Educação Infantil em 2016. Estava com duas histórias preparadas: O duende da ponte e Qual a cor do amor?
Eles escolheram Qual a cor do amor?


sábado, 2 de julho de 2016

O IMAGINÁRIO EM REGGIO EMÍLIA

O IMAGINÁRIO EM REGGIO EMILIA

Heide S. Miranda

No trabalho dos professores de Reggio Emilia, cidade do norte da Italia na Italia, se valoriza, dentre outras coisas, a observação, pois essa postura valoriza a atenção, a curiosidade, desafia o desejo de conhecer o mundo que a rodeia, educa esteticamente, além de interferir em muitos outros aspectos.
Entendo que a mais importante capacidade humana é a de imaginar, e isso, na proposta desenvolvida em Reggio, tem em abundância, lá o elemento criativo é imenso, a começar das salas de aula que foram substituídas por grandes ateliês, ricos em objetos diversificados que aguçam o processo criativo e aumentam as experiências das crianças que manipulam desde sucatas como: botões, tecidos, velas, retalhos de papéis, diferentes tipos de grãos, sementes, pedaços de madeira, lã, etc., além de objetos comuns de ateliês: mesas de diferentes tipos, com luz no tampo, pincéis, diferentes tintas, cavaletes, tesouras, réguas, etc.
Esses recursos são utilizados pelas crianças sem censura, como: vidros, arames encapados, tesouras com pontas entre vários coisas apontadas por nós como perigosas. O papel do adulto, tanto o professor como o atelierista, no processo de construção e levantamento de hipóteses do pensar sobre algo é criar possibilidades de concretizar suas fantasias. Em um dos projetos "parque de pássaros", as crianças imaginaram como seria fantástico se os pássaros também tivessem um parque de diversões, uma fonte para refrescar e outros brinquedos para alegrá-los. A função do adulto foi alimentar essa idéia e construir uma rede de parcerias: com a comunidade, imprensa, profissionais da área de construção dessa natureza, como encanador por exemplo e professores que utilizamos desenhos e idéias dos alunos e discutiam o processo de descoberta e desenvolvimento das crianças.
Esses professores encorajam seus alunos para as experiências que a princípio parecem inviáveis para a escola. Em Reggio os professores se utilizam dessas fantasias encorajando-os a discutir as possibilidades de realização de novos experimentos, com isso o professor se utiliza das explicações e falas para estudar o potencial infantil, cultivar e promover o processo criativo, apontar a importância do respeito às idéias do outro e entender que as crianças criam verdadeiras teorias a partir de suas observações e que a liberdade nas colocações de suas idéias levam-nos a falar de maneira extremamente poética. As experiências das crianças ganham registros variados, como: relatórios dos professores, artigos em jornais e revistas educacionais, documentação na escola contendo: desenhos das crianças, fala dos mesmos, relato do professor apontando o desenvolvimento do projeto e isso ganha uma importância incrível, pois tudo isso não fica enclausurado na escola, ganha as ruas, espaços públicos, então a criança entende que o que ela faz na escola é muito sério, pois outros vão aprender com o que eles aprenderam pesquisando, observando e trabalhando na escola.
Além disso, desde 1986, Reggio organiza uma mostra que corre o mundo, chamada "As cem linguagens", onde as descobertas das crianças, são expostas em grandes painéis e corre o mundo: parte dessa mostra esteve no Brasil em setembro no instituto Tomie Otake e foi vista por muitos educadores, que como eu, se interessam por experiências educacionais, que tem a criança como protagonista e que entende a cultura como braço direito da educação. Os trabalhos de Reggio não podem ser desperdiçadas nem ignoradas, por isso no próximo artigo vamos contar com mais detalhes um projeto muito interessante, intitulado "O monumento das cores", que foi realizado, a partir de um estudo que crianças de Reggio de 10 anos antes tinham estudado, ou seja, outro aprendizado para nós: o que grupos anteriores aprenderam nâo devem ser inutilizados, mas utilizados como início de novas discussões, novos projetos.
Heide S. Miranda é Coordenadora Pedagógica do Programa Jornal na Educação do Diário da Região, de São José do Rio Preto/SP
Artigo publicado em www.diarioweb.com.br